III Parte
- Então – disse Nyra – primeira parte do nosso projeto. Vamos a Bergen, na Noruega.
- O QUÊ?
- Sim, tem algo lá que preciso te mostrar. Sem isso, todos os outros passos ficarão bem mais complicados.
- Mas como assim, não posso sair viajando desse jeito.
- Como não? Você não terá mais aulas pelos próximos dois dias e você tem uma certa reserva de dinheiro, não? Podemos ir tranquilamente.
- E se eu não concordar?
- Olha, se você não tivesse percebido minha presença, eu teria formas de persuadi-lo. Agora você pode saber o que está acontecendo, mas eu ainda tenho essas formas. E você quer saber qual sua relação com a música, não quer?
E sem perceber, William tinha sido persuadido.
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Quando se deu conta, William já estava em Bergen, em frente a uma igreja gótica. O tempo estava fechando.
- Ainda me sinto em Oxford.
- Se vai chover, é melhor entrarmos, não?
- Mas o que estamos fazendo aqui?
- Viemos ver uma apresentação de órgão, oras.
- Mas por que precisamos vir até aqui para...
Calou-se, porque a apresentação já estava começando. Pelo menos respeito à arte ele possuía, e muito. Uma fuga de Bach estava tocando. Sentaram nos bancos do fundo, e William nem percebeu quando Nyra jogou uma fina poeira sobre ele.
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- Nyra, foi maravilhoso. Nunca imaginei que algo desse tipo pudesse ser tão cativante, envolvente.
- Sim, e o que mais você sentiu?
- É estranho, mas parece que em um determinado momento eu me tornei um com a música, podia senti-la pulsando em meu corpo.
- E...?
- E... e... tive a impressão de que podia sentir cada pessoa que já havia passado por aquela igreja, músicos e espectadores. Podia sentir tudo, suas dores, suas alegrias, suas vidas inteiras. De todo mundo que passou por lá desde que essa igreja existe.
- Ótimo. – disse Nyra – Agora à Londres.
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Chegaram a Covent Garden, um dos centros de comprar e entretenimento de Londres. Foram em direção à Covent Garden Piazza.
William podia ouvir uma música muito alegre tocando ao fundo, mas não sabia o que era.
- Isso é Vivaldi – disse Nyra - “A Primavera”. E mais uma vez, William não percebeu a fina poeira.
William ficou vidrado durante toda a apresentação. Era levado pela música, pra cima, pra baixo. Em alguns momentos sentia vontade de sair dançando, precisava se segurar para não fazê-lo. Em outros ficava cabisbaixo, introvertido. E seus sentimentos eram levados pela música. Chegou a perceber uma lágrima querendo escorrer, e a limpou rapidamente, envergonhado.
- Okay – disse Nyra – suficiente. Agora à Paris.
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E mais uma vez, antes que se desse conta, William já estava lá, aos pés das escadarias da Basílica de Sacré-Coeur, ponto turístico famoso de Paris.
- Agora, quero quer preste especial atenção ao músico no centro do círculo.
E mais uma vez a poeira voou, sem a atenção de William.
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Essa foi a experiência mais forte de todas. Dessa vez, já sabia que era a mesma peça de Vivaldi ouvida em Covent Garden. William sentiu como se ele próprio fosse aquele músico. E sentiu como, no momento em que tocava, só sentia a música, o dedilhar no violino, o rápido movimento do arco. Se sentia dominado, completamente entregue àquilo. No clímax da música, sentiu-se chegando a um êxtase e sentiu que portas que estavam fechadas nele há muito tempo se abriram e sabia que nunca mais conseguiria fechá-las. Desta vez não resistiu, desceu ao chão e deixou as lágrimas escorrerem.
Nyra observou aquilo impressionada, com William e consigo mesma. Nunca imaginaria que ele realmente passaria pela transformação completamente e tão rápido. E que ela ficaria tão emocionada e orgulhosa ao presenciar esse processo. Sentiu algo mudar nela também e se recordou da experiência que William descreveu em Bergen. Não só era possível sentir e reconhecer a vida de todas as pessoas, mas também de todas as raças, de todos os mundos. Nyra sentou no ombro de William e chorou também.
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Epílogo
Nyra conseguiu permissão do Sábio Superior, Petreks, para voltar ao mundo de William. Afinal, ela tinha se provado muito capaz ao completar sua missão com tanto sucesso.
Todos no plano dos Pixies estavam orgulhosos do que ela tinha conseguido. Não só tinha atingido seus objetivos em tempo recorde, como as mudanças nela mesma eram óbvias. Tinha adquirido um respeito muito maior por todos e desenvolvido um olhar para talentos, ajudando outros Pixies e implorando por novas missões a outros mundos para poder ajudar outras criaturas. Mas nunca precisava implorar muito porque sempre havia alguém precisando de ajuda e Nyra provou que dava conta do recado.
Além de que tinha desenvolvido todo um novo gosto pela música, ela mesma agora sentindo tudo com mais emoção, deixando essa emoção levá-la onde quer que fosse.
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Nyra chegou nesse mundo já na igreja onde William tocaria. Era uma apresentação especial, usando instrumentos de época, realizada em uma igreja com uma acústica peculiar. Nyra logo viu William afinando seu violino. Seus olhos encheram de lágrimas. Sentia muito orgulho do que William tinha se tornado. Agora apresentava mais força, mas podia se ver um olhar cheio de meiguice, pronto para por seus sentimentos para fora quando fosse necessário.
A apresentação começou e imediatamente toda a platéia calou-se e passaram a se concentrar nos sons, perfeitos, que ecoavam pela igreja. Era como ser transportado de volta ao período barroco e sentir o fluxo de emoções se revirando em você. Podia-se perceber a compenetração da platéia.
William estava belíssimo, radiante, seus olhos brilhando, fazendo o que realmente amava. Dava para sentir sua entrega àquele momento.
Nyra percebia que a cada nova peça a platéia ficava mais leve: Vivaldi, Pachelbel. No final, parecia que todos levitavam.
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Assim que acabou a apresentação, William sentiu a brisa familiar:
- Nyra?
- William, que orgulho que sinto de você. - disse, abraçando a bochecha dele.
- Obrigado, Nyra. Que saudades que senti de você.
- Eu também. Você foi meu primeiro trabalho e até hoje o mais significativo. Não poderia ter recebido tarefa melhor. Você mudou o meu modo de ver as pessoas e a mim mesma.
- Nyra, só posso dizer o mesmo de você. Hoje sei que nunca seria feliz trabalhando com qualquer outra coisa que não música. Não tenho como te agradecer por tudo que fez por mim. Hoje sou outra pessoa.
- Não, William, não era esse meu objetivo. Hoje você é você mesmo. E eu também